Por Diana Chaib*

Divulgado em junho de 2022, o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil revelou que apenas 4 de um total de 10 famílias conseguem acesso pleno à alimentação. No ano de 2022, 33,1 milhões de brasileiros não tinham o que comer. Isso significa que nosso país registrou 14 milhões de novos brasileiros em situação de fome em um período de um pouco mais de um ano. A pesquisa mostra ainda que mais da metade da população brasileira (58,7%) convive com a insegurança alimentar em algum grau – leve, moderado ou grave (fome).

Vários foram os fatores que tornaram o quadro desta pesquisa ainda mais perverso: o descaso e a negligência do governo Bolsonaro (2019 – 2022) no que diz respeito a questões sociais e econômicas, o desmonte das políticas públicas, a piora no cenário econômico durante o período pandêmico, o aprofundamento das desigualdades sociais no Brasil, dentre outros.

Diante disso, e apesar do Brasil ser um grande produtor e exportador de produtos primários, grãos e alimentos no geral, esse quadro traz à tona alguns dos principais desafios existentes no cenário atual relacionados à luta pela soberania alimentar quais sejam: acabar com a fome, promover a segurança alimentar, melhorar a nutrição da população e fomentar a agricultura sustentável.

Teoricamente, soberania alimentar implica no direito e na autonomia da população de um país de organizar a produção e a distribuição dos alimentos. Além disso, a soberania alimentar se baseia na ideia de cultivo de alimentos e hábitos saudáveis, que respeitam o meio ambiente e que são desenvolvidos em sistemas locais de produção.

Um país ter soberania alimentar significa que existe uma política nacional de produção e distribuição que garanta alimentação suficiente para todo o seu povo, estabilidade para enfrentar problemas sazonais como por exemplo queda na produção devido a um fator climático, variedade nos alimentos que possibilite uma alimentação equilibrada e com os nutrientes necessários e justiça e igualdade no que diz respeito ao acesso de cada cidadão, tanto em quantidade como em qualidade.

Dramaticamente, nosso país está longe de ter alcançado a soberania alimentar.

A luta pela soberania alimentar está em uma linha tênue com a questão da democratização do acesso à terra, o desenvolvimento de modelos produtivos sustentáveis e a agricultura familiar. Temos visto, historicamente, a necessidade de garantir o acesso à terra para que os agricultores e camponeses possam trabalhar, garantir a viabilidade de técnicas da agroecologia que permitem uma produção de alimentos livre de venenos e, consequentemente, mais saudáveis, elaboração de políticas que incentivem a formação de cooperativas agroindustriais, dentre outros.

Além dos pontos destacados e de prover a autonomia alimentar do povo de um país, a luta pela soberania alimentar está associada à geração de empregos e um contexto no qual o país consegue diminuir a dependência das importações, não se sujeitando tanto a flutuações dos preços no mercado externo.

Apesar do quadro crítico que o Brasil se encontra, é inegável que a eleição do presidente Lula foi um passo decisivo e importante no que diz respeito à luta pela soberania alimentar no país.

A soberania alimentar é uma demanda atual e urgente.

Inclusive, essa é umas das principais pautas do atual governo.  Nas palavras do presidente Lula: “Primeiro, nós temos que entender que todo e qualquer país do mundo que queira ter o mínimo de soberania tem que ter um programa de segurança alimentar.  E ele tem que ter uma política concreta de um estoque regulador para que, em qualquer momento de crise, não falte alimento no seu país”.

Um marco importante nessa luta foi a reativação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), que tem como objetivo garantir a existência de uma política de segurança alimentar e nutricional ao povo brasileiro. O órgão, conhecido por contribuir para retirar o Brasil do mapa da fome em 2014, havia sido desativado em 2019, sob o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.

A construção da nossa soberania alimentar é um desafio extremamente necessário pelo qual devemos continuar lutando. Nessa luta, a nossa participação social se faz cada vez mais relevante, identificando e dimensionando o problema, para assim poder demandar dos nossos representantes cada vez mais políticas públicas direcionadas que atendam as nossas prioridades.

* Diana Chaib é economista e doutoranda em Economia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da UFMG. É especialista em Macroeconomia e tem interesse nas áreas de crescimento econômico, desenvolvimento econômico e economia da China.

** As opiniões expressas nesse texto não representam necessariamente a posição do jornal Brasil de Fato.

Edição: Vivian Virissimo